9 de maio de 2012

Mãe e filha são assassinadas e neta é única testemunha

Pelos cômodos da casa de número 464, na rua Antônio Lopes Chaves no bairro de Nova Parnamirim, um cenário de terror. Crueldade e tortura marcaram os assassinatos de Olga Cruz de Oliveira Lima, 61 anos, e Tatiana Cristina Cruz de Oliveira, 36 anos; mãe e filha. Mortas na noite da segunda-feira passada, os seus corpos foram encontrados ontem pela manhã. A polícia invadiu o local após suspeita de vizinhos. Em um dos quartos da residência, encontrou Tatiana amarrada a uma cadeira, com perfurações de faca, marcas de espancamento e dedos cortados. No chão da cozinha, Olga também apresentava marcas de pancadas e cutiladas. Os primeiros indícios apontam para um caso de latrocínio - quando se mata para roubar -, mas a crueldade praticada por criminosos intriga os investigadores. 
Adriano AbreuCrime chamou a atenção da vizinhança que desconfiou e chamou a polícia na manhã de ontemCrime chamou a atenção da vizinhança que desconfiou e chamou a polícia na manhã de ontem

O duplo assassinato deve ter o inquérito conduzido pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), do município de Parnamirim - Região Metropolitana. Na cena do crime, a delegada Patrícia de Melo Gama preferiu repassar poucas informações, "para não atrapalhar o andamento dos trabalhos". Ainda durante a tarde de ontem, a polícia começou a colher informações de familiares e vizinhos que pudessem acrescentar algo ao inquérito. Os primeiros depoimentos começarão a ser colhidos hoje na Deam.

Na noite da segunda-feira passada, uma menina de 10 anos de idade, que vagava pelas ruas próximas à cena das mortes, chamou atenção dos vizinhos. Com escoriações e ensagüentada, a criança, filha de Tatiana Cristina, foi conduzida para atendimento médico de urgência no Hospital Clóvis Sarinho. Suspeita-se que ela tenha presenciado todo o crime mas, ainda em choque, não forneceu informações precisas sobre o caso. Durante o dia de ontem já havia sido liberada e passa bem.

"Encontramos a menina vagando aqui pela rua e ficamos preocupados com os ferimentos que ela tinha, a levamos para o hospital. Ela não sabe dizer muita coisa, está muito desorientada", afirmou a universitária Katiúcia Matias, moradora próxima.

Após prestar atendimento à menina, vizinhos não conseguiam encontrar a sua mãe e avó e começaram a desconfiar de algo. Durante a manhã de ontem, chamou atenção a água que escorria pela calçada e atingia a rua, em virtude de um transbordamento da piscina. Também era estranho o latido incessante dos diversos cachorros de dentro da residência. Foi então que  acionaram a polícia.

"Por volta das 10h30, fomos acionados e chegamos ao local. Quando entramos na casa, nos deparamos com os corpos e tomamos os procedimentos cabíveis", relatou o major PM Marlon de Góis. De acordo com o oficial, a hipótese de latrocínio é cogitada uma vez que equipamentos eletrônicos, como televisões, foram levadas da casa. O carro da família, um modelo Ford Fiesta de cor vermelha, também foi tomado por criminosos.

Equipes do Instituto Técnico-científico de Polícia (Itep) estiveram presentes ao local no início da tarde de ontem e realizaram a retirada dos corpos para necrópsia. O exame irá detalhar os ferimentos sofridos pelas vítimas, assim como confirmar ou não a suspeita de que Tatiana também teria sofrido violência sexual. Peritos do Itep realizaram a vistoria na residência em busca de vestígios que pudessem esclarecer as circunstâncias da ocorrência.

Agentes da Polícia Civil também estiveram no local para dar início às investigações. A residência dispõe de circuito de câmeras de segurança. O computador foi levado para ser verificado a existência de imagens que possam auxiliar no andamento do inquérito. 

Investigação se divide entre latrocínio e vingança

Durante a tarde de ontem, a equipe de reportagem da TRIBUNA DO NORTE voltou a ouvir a delegada Patrícia de Melo Gama. Ela se disse intrigada e dividida entre as hipóteses de latrocínio e vingança. "Aparentemente foi um latrocínio, mas a crueldade dos assassinatos aponta para um crime de vingança. Ainda está cedo para falar alguma coisa de concreto, ainda vamos ouvir as testemunhas", disse. 

Outras linhas não foram descartadas. Familiares informaram de problemas que Tatiana e Olga tiveram recentemente com pedreiros que realizavam reformas na residência. Assim como problemas conjugais que Tatiana teve com o ex-marido, um homem de naturalidade portuguesa. 

A delegada informou que a menina de 10 anos, que seria testemunha ocular dos assassinatos, foi encaminhada para avaliação psicológica no Itep. "Ela não fala de modo coerente. Diz que os ferimentos que teve ocorreram em virtude de uma queda", afirmou Patrícia de Melo. 

Perito

Tatiana Cristina Cruz de Oliveira tinha um tecido amarrando suas mãos. Na perna, cordas a amarravam a uma cadeira, que estava caída no chão de um dos quartos da casa. Sem mordaças. No pescoço, perfurações por arma branca e, pelo corpo, outras marcas de violência. Em uma das mãos, o dedo polegar quase amputado. A sua mãe estava na cozinha, com marcas semelhantes de violência e crueldade. Pelos cômodos da casa, sangue das vítimas, "como se elas tivessem percorrido cada lugar, após as torturas".

O relato é do perito do Itep, Georgino César de Souza. Após o encontro dos cadáveres, Georgino periciou o local por aproximadamente duas horas e, mesmo com a experiência inerente da profissão, se disse chocado. "Esse foi um dos casos que mais me chamou atenção. Isso porque foi marcado pela forma brutal que foi executado, com requintes de crueldade", disse. 

Dona de casa e residente no local há aproximadamente 10 anos, Tatiana é descrita por vizinhos como uma pessoa de poucos contatos na proximidade. Os moradores se lembram dela por ser engajada em causas, como cobrar o calçamento da rua Antônio Lopes Chaves e protestar contra o fechamento de um retorno na avenida Maria Lacerda Montenegro. A casa, pelo que pôde ser visto do lado de fora, conta com piscina e um canil, com pelo menos cinco cachorros. Cerca elétrica e duas câmeras reforçavam a segurança do local. Há informações de que a residência passava por reformas e pedreiros frequentavam o local. 

Terapia é fundamental para a criança

Assistir aos assassinatos da mãe e da avó certamente é situação impactante para qualquer pessoa. Multiplique-se então a sensação quando a testemunha ocular trata-se de uma criança. Isso pode ter ocorrido no caso do duplo homicídio registrado em Nova Parnamirim. Uma menina de 10 anos de idade teria visto o crime sendo praticado e acabou ferida levemente em virtude das agressões contra os familiares. A professora doutora e pesquisadora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Elza Dutra, recomendou suporte psicológico em virtude do "ato de extremo impacto" contra a criança.

Em entrevista durante a tarde de ontem, a professora esclareceu como o crime repercute em pessoas dessa idade. "Há uma repercussão enorme e causa um transtorno emocional muito forte", disse. Segundo Elza, é necessário um acompanhamento intenso de psicólogos, assim como de familiares que darão a sensação de acolhimento à menina. "O acompanhamento profissional é necessário para que ela possa recuperar esse momento e dar a ele um resignificado", afirmou.

O fato de a criança estar dando declarações incoerentes a familiares e policiais é uma "forma de estar negando o que ela viu". 

Investigação

Como testemunha ocular, a criança seria uma peça fundamental para que a polícia alcançasse informações sobre a autoria do crime. Mas isso deve ocorrer da forma adequada. "A Justiça conta com o serviço de 'depoimento sem dano', em que a criança fornece as informações a um psicólogo, enquanto é assistida remotamente por autoridades como juízes ou delegados", esclareceu a professora Elza. Para ela, esse é o caminho correto. "A polícia poderia procurar a Vara da Infância, que dispõe desse serviço". A especialista acrescentou que "não se pode se submeter a criança a depoimentos iguais a de um adulto". "O delegado precisa ter sensibilidade e esperar um tempo".

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