Em parecer enviado ao ministro Edson Fachin, responsável pelos casos
relacionados à Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, a
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou que a Segunda
Turma da Corte rejeite o pedido de liberdade apresentado pela defesa do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A análise do habeas corpus
do petista está marcada para a próxima terça-feira, 4 de dezembro.
No documento de 35 páginas em que se manifesta pela rejeição do
pedido de liberdade de Lula e de suspeição do ex-juiz Sérgio Moro,
Raquel Dodge escreve que o fato de a condenação de 1ª instância, seguida
da prisão provisória e da inelegibilidade de Lula, terem sido
confirmadas sucessivas vezes por inúmeras instâncias judiciais
“apresenta-se como elemento objetivo robusto a demonstrar que ele não é
um perseguido político, mas, sim, um cidadão que está sendo, justamente,
repreendido pelo Estado, em razão dos crimes que praticou.”
A defesa de Lula entrou com um novo habeas corpus no STF no início de
novembro, depois que Moro aceitou convite para ser ministro da pasta da
Justiça e Segurança Pública no governo do presidente eleito, Jair
Bolsonaro (PSL). Para Raquel Dodge, é “absolutamente impróprio” que o
ex-presidente, “inconformado com as decisões proferidas ao longo dos
mencionados incidentes processuais”, resolva renovar a discussão sobre
sua liberdade em mais um habeas corpus.
Os advogados pedem que seja reconhecida a suspeição do ex-juiz
federal Sérgio Moro por suposta “perda da imparcialidade”, anulando-se
todos os atos do então magistrado no caso do tríplex do Guarujá e em
outras ações penais que miram o petista. Caso seja atendido, o pedido
resultaria na liberdade do petista.
Para os advogados do ex-presidente, Moro agiu no caso de Lula “movido
por interesses pessoais e estranhos à atividade jurisdicional,
revelando, ainda, inimizade pessoal” com o ex-presidente. “Lula está
sendo vítima de verdadeira caçada judicial entabulada por um agente
togado que se utilizou indevidamente de expedientes jurídicos para
perseguir politicamente um cidadão”, sustentam os defensores do petista.
Além de Edson Fachin, integram a Segunda Turma do Supremo os
ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e o decano do
tribunal, ministro Celso de Mello.
No documento, a procuradora-geral diz que desde que passou a ser
processado na ação penal que levou à sua condenação, o petista “vem
insistentemente, não apenas nos autos, mas também na imprensa e até
mesmo perante a Organização das Nações Unidas, defendendo ser vítima de
perseguição política e de guerra jurídica por parte do então juiz
titular da 13ª Vara da SJ/PR, Sérgio Moro”.
Na avaliação de Raquel Dodge, a prisão provisória e a inelegibilidade
do ex-presidente resultaram de procedimentos judiciais em que foram
asseguradas todas as garantias constitucionais, em especial o direito à
ampla defesa e ao contraditório, tendo sido confirmadas por mais de uma
instância. Segundo ela, foram conferidas a Lula todas as oportunidades
previstas no ordenamento jurídico para impugnar as decisões proferidas
contra ele.
“A hipótese defensiva levantada por Luiz Inácio Lula da Silva, ao fim
e ao cabo, busca desqualificar não apenas a atuação do então juiz
titular da 13ª Vara da SJ/PR, mas de quase todas as instituições
jurisdicionais do país.”
No pedido de liberdade feito ao Supremo, a defesa de Lula sustenta
que uma semana antes do primeiro turno das eleições, Moro, de ofício,
levantou sigilo de parte da delação premiada de Antônio Palocci com o
objetivo de prejudicar Lula e favorecer seus concorrentes. Para Raquel
Dodge, no entanto, a decisão de Moro está em conformidade com os poderes
instrutórios conferidos ao juiz pelo ordenamento jurídico.
“Mais uma vez, o ato apontado pelos impetrantes como indiciário de
perseguição ao ex-presidente não passou de um ato judicial comum
praticado com base nos poderes instrutórios do magistrado, devidamente
justificado segundo a convicção do julgador”, escreveu Raquel Dodge.
A defesa de Lula alega ainda que a aceitação por Moro para ocupar o
Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo Bolsonaro é um
indicativo que comprovaria a tese de que ele, quando magistrado, agiu
com o intuito de afastar Lula das eleições presidenciais e beneficiar o
capitão reformado.
“Mais uma vez, os impetrantes fazem ilações infundadas, as quais não
podem justificar o reconhecimento da suspeição de Sérgio Moro e a
nulidade integral da ação penal”, escreveu Raquel. A procuradora-geral
diz que impossibilidade de Lula de concorrer na eleição deste ano foi
motivada pela condenação confirmada em diversas instâncias judiciais.
“Diversamente do que sustentam os impetrantes, trata-se de condenação
robusta, fruto de processo em que asseguradas todas as garantias
constitucionais e legais, e não um ato de perseguição.”
Raquel Dodge diz ainda que a sentença proferida por Moro na ação
penal que condenou Lula é de julho 2017, quase um ano antes de o petista
e o presidente eleito Jair Bolsonaro se lançarem como candidatos.
“Ademais, quando proferiu a sentença acima mencionada, por óbvio, Sérgio
Moro não poderia imaginar que, mais de um ano depois, seria chamado
para ser Ministro da Justiça do Presidente eleito. A aceitação de tal
convite, sendo uma opção de vida legítima de um cidadão livre, não tem o
condão de ultrapassar a estrita esfera pessoal do magistrado e, por si
só, lançar dúvidas sobre a sua retidão e imparcialidade na condução da
ação penal”.
Estadão Conteúdo